Muita gente perguntou pelo texto sobre como conversar com meninos e aqui está ele. A abordagem do texto, no entanto, é um pouco diferente do das meninas. A autora, Lisa Bloom, conversa com um menino mais velho, de 12 anos, e sua intenção é investigar por que os meninos não leem. Ela cita várias consequências do não-incentivo à leitura para os meninos (algumas um tanto extremas, do meu ponto de vista) e o texto me parece um pouco mais complicado, levantando questões como desigualdade social e falta de investimento na educação.
Como conversar com meninos
Meu amigo Oliver tem 12 anos. De vez em quando eu dou uma folga para sua mãe solteira e ele vem passar um tempo na minha casa. Ele é ótimo andando de skate, dança super bem e irradia uma doçura angelical. “Você é uma boa pessoa”, ele me disse uma vez, do nada, e me deixou chocada. Ele sempre enxerga o melhor nas pessoas, embora seu histórico de vida inclua alguns anos num abrigo para sem-teto e um pai abusivo. Recentemente estive com Oliver num dia ensolarado da Califórnia. Estávamos na piscina comendo melancia e relaxando. Ele adora falar sobre seu Xbox e sobre vídeos do YouTube. Em vez de seguir com esses assuntos, perguntei a Oliver “Têm lido algum livro ultimamente?”. Como resposta, ele murmurou “Talvez”. Livros não são a coisa preferida do Oliver. Eu sei que ele prefere falar sobre basquete, ou sobre marcas de tênis, mas eu não podia, eu estava numa missão.
“Qual é o seu livro preferido?”, perguntei. “Não sei”, ele disse, olhando para o horizonte.
Oliver só lê quando é extremamente necessário. Você nunca o veria lendo um livro debaixo das cobertas com uma lanterna acesa, como eu fazia quando tinha a idade dele. (O brilho vindo da sua cama no meio da noite provavelmente seria de um iPhone)
Quando tivemos esse momento, eu estava escrevendo o livro “Swagger: 10 Urgent Rules for Raising Boys in an Era of Failing Schools, Mass Joblessness and Thug Culture.“ (“10 regras urgentes para educar meninos numa era de escolas falidas, desemprego em massa e cultura do valentão”, em tradução livre). Eu estive pesquisando todas as forças culturais que estão “emburrecendo” nossos garotos. Então eu precisava ir fundo na raiz da questão.
“Você gosta de ler, Oliver?”, perguntei. “Claro!” ele disse, sem convicção, daquele jeito que as crianças respondem o que elas sabem que você quer ouvir. “Sério?” “Bem, tipo, se não tiver mais nada pra fazer, tudo bem”, ele admitiu, “se você não puder fazer algum esporte ou jogar videogame ou brincar com seus amigos.”
Isso não é um grande interesse.
“Você acha que ler é coisa de menina?” perguntei – sobre um dos mais surpreendentes comportamentos identificados na minha pesquisa – mantendo minha expressão o mais indiferente possível. A primeira vez que li sobre isso foi no livro de Peg Tyre “The trouble with boys” (“O problema com os meninos”) e continuei encontrando essa atitude em muitos meninos que entrevistei. Ano passado, escrevi “How to talk to little girls” (“Como conversar com meninas”), e fiquei emocionada em como viralizou, sendo lido e compartilhado por milhões de pessoas ao redor do mundo (NT: meio o que aconteceu com a tradução aqui no blog). Os pais eram intensos em incentivar as meninas a assumir sua inteligência e amar a leitura. O que eu não percebi foi que fazer com que os pais tenham a mesma atitude com os meninos era bem mais difícil, devido ao estereótipo cultural de que os meninos são melhores em atividades mais ativas, como esportes.
“Não”, Oliver disse que não achava que ler era coisa de menina, provavelmente me dando a resposta que ele acreditava que eu queria. Mas então, ele deixou escapar “Mas vários amigos meus acham!” “Por que você acha que eles pensam assim?” “Porque a gente prefere fazer coisas,” ele disse, defendendo os amigos. “Quando você lê você só fica sentado num lugar. As garotas não ligam de ficar sentadas o tempo todo, mas a gente prefere andar de skate ou algo assim quando queremos fazer alguma coisa.”
Em vez de tomar partido e dizer para ele “oi, a gente também não gosta de ficar sentada o tempo todo”, preferi perguntar de que livros ele havia gostado. Oliver só soube me dizer uma série de livros que ele gosta “39 clues” (“39 pistas”).
“Você sabia que a leitura era considerada uma coisa mais de meninos?”, continuei. Ele olhou para o horizonte, rejeitando minhas perguntas. “Não. Podemos nadar agora?”
***
As implicações da notícia de que as meninas ultrapassaram os meninos no quesito leitura — em todas as séries, nos 50 estados (dos EUA) — e que as garotas estão se formando no ensino médio e na faculdade com notas melhores e em número maior ainda não foram totalmente absorvidas pelos pais de meninos. Mostre-me um orador de formatura e provavelmente ela é uma mulher. Top 10 da classe do seu filho? Provavelmente a maioria são garotas. Os 10 piores? Aí estão os garotos.
Alguns pais, e até professores, têm uma atitude fatalista em relação a isso, e reduzem as expectativas para os garotos. A nova crença cultural é que as meninas naturalmente amadurecem mais rápido, que elas têm melhores habilidades verbais inatas e, assim, incentivar os rapazes a ler é irrealista e um tanto injusto com sua masculinidade. (Então é assim que explicamos por que todos os três vencedores da última feira de ciências da Google eram meninas? Será que agora acreditamos que as meninas são apenas melhores em tudo?) Deixem eles serem meninos! Deixem eles brincar!
Não. Nós não podemos aceitar perspectivas reduzidas para os nossos filhos, porque as implicações para as suas vidas são muito terríveis. Não há nada de intrinsecamente masculino no analfabetismo. Os meninos de hoje vão pior em testes nacionais de leitura do que os meninos de uma geração atrás. Não há mistério quanto ao porquê dos meninos terem escorregado. Meninos lêem significativamente menos do que as meninas, e menos do que os seus pais faziam quando eram crianças. Nove em cada 10 meninos de hoje não sentem prazer algum em ler, não mesmo. Como um próprio menino disse: “Eu prefiro ser queimado na fogueira do que ler um livro!”
De onde os meninos tiraram essa ideia louca de que ler “é coisa de menina”?
De nós. Afinal, é a mãe que normalmente lê em casa por prazer e não o pai (as mulheres lêem quase o dobro de livros que os homens link). Tipicamente é a mãe que lê histórias para os filhos antes de dormir. É a mãe que leva os filhos para a biblioteca ou para a livraria. O pai joga bola com eles. Na escola, geralmente eles são encorajados a ler por professoras mulheres, enquanto os professores de educação física geralmente são homens. Os livros infantis reforçam isso mostrando mais meninas lendo e mais meninos em ação nas ilustrações (pense na Hermione, a prodigiosa devoradora de livros, de Harry Potter). Nos aniversários, festividades ou simplesmente por acaso, damos livros de presente mais para meninas e equipamentos esportivos para os meninos. As crianças captam a mensagem bem cedo apesar de nossas melhores intenções: meninas lêem, meninos não.
É hora de mudar a direção desse barco. Porque o destino dos nossos garotos não-leitores é perigoso, de verdade. Pobres leitores – na sua maioria, rapazes – têm mais dificuldade para ler as matérias e testes de todas as disciplinas. Eles são suspensos, expulsos, reprovados e desistem dos estudos com uma frequência alarmante – a maioria dos nossos meninos afrodescendentes e latinos (que têm a menor proficiência em leitura de todos) desistem logo da escola e os meninos brancos se saem apenas um pouco melhor – por que não é essa a manchete principal em todos os noticiários?
Enquanto escrevia “Swagger..” eu encarei de perto as forças desestimulantes que pressionam nossos meninos: música popular que incentiva bater na namorada, atirar no inimigo, atacar gays e usar drogas. Cortes na educação que deixam professores no sereno, literalmente – dando aulas do lado de fora – ou implorando por livros para suas salas superlotadas de primeira série em sites de caridade. Aplicação da lei de forma desproporcional em bairros pobres, permitindo que menores sejam condenados a anos de prisão na primeira vez que são pegos portando drogas.
Novas prisões são construídas todos os dias, esperando para abrigar a próxima geração de garotos americanos.
Oliver não vai pra lá. Não sob a minha vista.
A boa notícia é que a pesquisa fornece soluções claras e baratas para o problema, começando pelo desenvolvimento de perspectivas, premiação da humildade e do esforço e diminuição do tempo “em frente da tela” (TV, video game, computador). Após combinar o resultado dos estudos com as entrevistas de pais, professores e especialistas, eu formulei uma lista com 10 regras para a criação de meninos inteligentes, fortes e preparados para o mundo real. Pais, eu espero que vocês as leiam por completo em “Swagger..,” mas aqui vai uma das mais importantes:
“Transforme sua casa em um templo de leitura. Mostre para seu garoto que a leitura é sua atividade mais prazerosa, aquela que você não vê a hora de começar e tem sempre dificuldade para parar”
Crianças com pais que lêem por prazer são seis vezes mais propensos a fazerem o mesmo – e suas notas disparam. É por isso que eu falo sobre os livros que eu amo e pergunto sobre os seus favoritos sempre que posso. Estou intencionalmente mostrando para eles que livros e ideias são valorizados pelos adultos.
Antes de deixar o Oliver cair na piscina, falei para ele que eu tinha acabado de ler toda a inquietante trilogia de “Jogos Vorazes”, sugerida pela minha filha. “Mas deve ser muito violento para você,” eu disse, calculadamente. “Hm, não sei, acho que você é muito novo pra isso.”
Eu não nasci ontem.
Os olhos de Oliver brilharam. “Eu ouvi falar desse livro! Ouvi que é sobre jogos e crianças que brigam até a morte!”. E concluiu, “não sou tão novo para isso!”
Não estou tentando manipular uma criança de 12 anos para que ela leia e você também não deve fazê-lo. Confira minha longa lista de “livros que os garotos amam” no final de “Swagger,” pergunte para o professor dele ou o bibliotecário da escola o que está fazendo sucesso entre os garotos atualmente, peça para ele ler o livro antes de ver o filme. Leve-o a bibliotecas, livrarias, feiras de livro. Traga-o para conferências na universidade local, para palestras de autores na sua cidade ou online. Peça para que todos os educadores preferidos dele falem sobre seus livros favoritos na sua presença. Coloque estantes de livros em todos os cômodos da casa, sim, até mesmo naquele trono favorito de leitura masculino, o banheiro. Leia para ele, leia com ele, leia do lado dele durante a noite. Ouça audio books enquanto dirige. Quando for chamado para jantar, peça para terminar só mais um capítulo e deixe-o terminar o dele.
Incentive-o a ler como se sua vida dependesse disso.
Porque, na verdade, depende.
Imagem: www.canva.com